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Morar em Portugal: Como é a adaptação?

Eu já tinha feito um post sobre o que aprendi ao morar em Portugal quando completei 1 ano aqui, porém, agora com mais material de experiência, resolvi escrever sobre um assunto pouco explorado nos blogs de quem já fez a mudança do Brasil para Portugal: a adaptação.

Hoje não vou falar muito sobre a adaptação e inserção na sociedade como imigrante. O que quero contar aqui é como foi a minha adaptação em termos de clima, saúde e vestuário. Pretendo ainda fazer posts futuros sobre a adaptação na cultura, alimentação e todas essas coisas que tem um impacto diário nas nossas vidas, quando vivemos em um país que não é o nosso.

Eu nasci e fui criada no Rio de Janeiro, como um típica carioca da gema: amante dos subúrbios e da Zona Sul, do Carnaval (dos bloquinhos de rua aos desfiles no Sambódromo), de ir para a praia quase todo final de semana, de pegar sol quase todo dia, admiradora das paisagens naturais e por aí vai. O Rio é grande, com muita gente, além de ser uma das cidades mais quentes e úmidas do Brasil.

Atualmente, eu moro numa cidade também litorânea, mas pequena e com pouca gente, no Centro-Oeste de Portugal. (Fica a 1hr de Lisboa, para se situarem melhor.) Portanto, quem vem/veio de outras cidades e estados brasileiros e vai/veio para outras regiões de Portugal pode não concordar com o que eu relatarei, por não ter o mesmo background que o meu e eu respeito isso.

Para mim, o choque da mudança e da adaptação foram tão intensos que eu apresentei diversos sintomas a partir de quando cheguei aqui e até fizeram os médicos suspeitarem e iniciarem uma investigação de lúpus.

Felizmente, depois de meses de exames e acompanhamentos, chegamos a um diagnóstico negativo. Por fim, o reumatologista disse que eu não era a primeira paciente brasileira que apresentava esses sintomas após a mudança de país. Vou tentar organizar tudo em tópicos a seguir.

O CLIMA

Eu já visitava Portugal desde a adolescência, já tinha vindo no verão e no inverno, e também já tinha viajado para outros países com geografia e condições climáticas diferentes das do Brasil. Posso dizer que sempre tirei de letra e até que sentia minha pele e cabelo melhores no frio, mas aí entra aquela história: morar em algum lugar é completamente diferente do que estar apenas de passagem. E não só em questões climáticas, para todas as outras também, mas isso veremos mais à frente.

As estações costumam ser bem marcadas em toda a Europa: o Verão é bem quente e seco (chega aos 35º aqui, chega aos 40º na Polônia…), o Inverno é bem frio e chuvoso (temperatura média de 0º aqui e muitos graus negativos lá pro norte da Europa) e a Primavera e o Outono costumam ainda serem “gelados”, com temperatura média de 15º. Sendo assim, o que acontece então? Tempo ameno (para um carioca, isso seria uns 25º) e calor mesmo (aquele que dá praia) só durante uns 2 meses por ano.

A consequência disso é que parece que você vive eternamente “naqueles dias que a gente quer tirar de folga no Rio”: cinzentos e com muita chuva. O inverno em Portugal é EXTREMAMENTE chuvoso, posso dizer que chove praticamente todos os dias e às duas da tarde já parece noite.

Nós temos o Horário de Verão no Brasil e aqui há o Horário de Inverno, quando atrasamos o relógio em 1 hora para ajudar o povo a levantar, já que o sol só apareceria lá pelas 8 da manhã no horário normal. Ainda assim, dá preguiça e desânimo de fazer suas tarefas e a vontade é de passar o dia inteiro na Netflix.

Em compensação, Portugal (e, principalmente, Lisboa) é considerado o refúgio ensolarado da Europa no Verão. Os dias são super longos porque anoitece por volta das 21h, não chove nunca (por isso, os incêndios todos os anos) e as pessoas e o comércio aproveitam a época para funcionar a todo vapor. Quer dizer, nem a tanto vapor assim porque é a época quando a maioria tira férias e vários estabelecimentos fecham…

Morar em Portugal: Cascata em Fraga da Pena
Mesmo no auge do verão, as águas de Portugal continuam MUITO frias! Só Deus sabe o que eu passei nessa cascata em Fraga da Pena.

A SAÚDE

» Pele

Lembro que assim que a minha mãe me viu, ainda no aeroporto, ela elogiou “Nossa, você está com a pele tão linda!”.

Foi passar pouco mais de um mês para o meu corpo começar a apresentar um dos primeiros sintomas da adaptação: a descamação.

O meu rosto, minhas orelhas, meu couro cabeludo, tudo começou a descamar. Além disso, comecei a apresentar rosácea também (para quem não sabe o que é, é quando a pele do rosto apresenta regiões avermelhadas por causa do aumento do fluxo sanguíneo). Só não coloco a foto do estrago aqui porque né, vocês não são obrigados a levar esse susto com a minha cara feia. hahaha

Gente, quando morava no Brasil, eu só usava hidratante quando me queimava demais na praia! Odiava perder tempo passando aquilo no corpo inteiro pra ficar toda melequenta depois. Aqui, cheguei à conclusão e depois a médica confirmou que pessoas com a pele sensível como a minha, devem manter a hidratação da pele durante todo o ano.

Além da descamação e rosácea, percebi o escurecimento e aparecimento de sinais na área que eu fazia depilação com luz pulsada. No Brasil, fazia esse procedimento há mais de 1 ano (já tinha feito umas 8 sessões) e nada havia me acontecido. Inclusive, fiquei super feliz quando descobri, perto da minha casa, uma loja da mesma franquia que eu utilizava no Rio.

Foram 2 sessões feitas em solo português para um resultado completamente diferente. O que me leva a suspeitar que na área de estética, o Brasil realmente esteja a anos luz de Portugal, com profissionais mais preparados e talvez até melhores equipamentos.

Minha pele nunca foi “sensível” ou seca, pelo contrário, dava pra fritar um ovo na minha testa enquanto morava no Rio. Aqui, as coisas se inverteram não somente pelo frio mas, principalmente, pela água!

 

» Água e Banhos

 

Portugal tem um dos melhores sistemas de tratamento da água e os especialistas garantem que é 100% seguro beber água das torneiras. Porém, já fui avisada por um médico que beber água da torneira frequentemente pode levar a criação de pedras nos rins por conta do elevado nível de calcário nela.

A região onde eu moro é campeã no calcário e até portugueses vindos de outras regiões reclamam dessa água “dura”, que é como eles chamam. As próprias embalagens de sabão para lavar roupa tem medições diferentes para águas assim.

A sensação ao tomar banho é que não se consegue fazer muita espuma com o sabonete em barra (talvez, por isso o mais usado aqui é o gel de banho ou sabonete líquido) e ao terminar, você percebe uma “camada” esbranquiçada na pele.

Todo brasileiro sabe da “lenda” que europeus não tomam muito banho. Para mim, vinda do Hell de Janeiro, pisciana amante da água e tendo chegado ao número de 8 banhos num só dia (eu não tinha ar-condicionado :'( ), é extremamente improvável que eu queira passar algum dia da minha vida sem me molhar. Mas, devido a todos esses problemas que tive aqui, fui aconselhada a diminuir o número de banhos para não remover a proteção natural da pele.

Tem sido difícil, mas tive que reduzir meus 2 banhos diários para somente 1. Talvez vocês vão precisar fazer o mesmo quando chegar aqui. Sei que existe um filtro para chuveiro que segura um pouco o calcário, mas ainda não tive a felicidade de encontrá-lo.  E isso nos leva ao próximo tópico…

 

» Cabelos

Ao mesmo tempo que minha pele começou a mudar, meus cabelos começaram a cair. Tipo, MUITO.

Acho que toda mulher se apavora ao notar o aumento da queda e ao fim de mais ou menos três meses (queria ter certeza que não era apenas uma queda sazonal), pedi para a minha médica de família me encaminhar para o dermatologista, até porque queria ver o caso da luz pulsada. Vejam bem, isso foi em setembro de 2015. Sabem quando eu consegui ser atendida pelo dermato? No final de outubro de 2016! É, a saúde não anda muito bem em Portugal, mas isso é assunto para outro post.

Para piorar, comecei a sentir meu couro cabeludo arder toda vez que lavava a cabeça. 🙁
Então, enquanto esperava a consulta do dermato, decidi trocar tudo o que eu usava e comecei a fazer Low Poo, uma técnica onde se usa produtos sem sulfatos e detergentes agressivos que os shampoos comuns têm.

Como já disse antes, o Brasil tem um mercado de estética e cosmética muito maior, com ampla divulgação e vários produtos específicos. Aqui, tive que ralar bastante para achá-los e explicar a técnica, pois os próprios donos e funcionários das lojas nunca nem tinham ouvido falar em low poo. Para quem se interessar, indico o grupo No/Low Poo Europa. É lá onde se consegue informação com as meninas que já residem aqui há mais tempo.

Aliado ao low poo, comecei também um cronograma capilar, que visa recuperar a saúde dos cabelos com etapas de hidratação, nutrição e reconstrução, usando produtos mais naturais. Comecei a passar azeite no couro cabeludo (aproveitando o que essa terra portuguesa maravilhosa dá) e gente, logo na primeira vez, senti um alívio gigante na ardência do couro!

A parte boa de todo esse meu ~ drama ~ é que eu notei uma melhora depois que comecei as técnicas e as mesmas me influenciaram também a não passar mais nenhuma química no cabelo e enfrentar a transição capilar.

Mas, voltando ao dermatologista, fui à consulta e não gostei muito do atendimento do médico porque ele nem me examinou direito. Disse que eu estava com dermatite seborréica, me passou um shampoo, alguns medicamentos para a queda, reclamou que “vocês mulheres se colocam em cada uma!” se referindo à luz pulsada e só. Volto lá em dezembro para saber se adiantou alguma coisa.




 

» Alergias Alimentares e Respiratórias

Passamos a mais uma das reações que tive e confesso que talvez tenha sido essa a que mais me apavorou.
Até porque, com tanta coisa sentida, parecia que Portugal estava dizendo “minha filha, volta pro Brasil que eu não te quero aqui não!” kkkk

Eu, que nunca tive alergia a nada e sempre comi de um tudo nessa vida, comecei a me sentir “estranha” depois de praticar exercícios, usar certos tipos de roupas e ingerir certos alimentos, principalmente alguns cereais e leguminosas, como milho, amendoim e grão de bico.

Como sei que uma alergia alimentar pode levar a um choque anafilático e até a morte e eu estava com uma viagem marcada para a Ásia, – a terra com comidas desconhecidas, mega condimentadas e cheias de amendoim – marquei consulta numa alergologista privada, pois pelo SNS iria demorar muito.

Fiz uns testes com ela (que confirmaram pequena alergia a tais alimentos), ela me passou medicações, recomendações e segui com o c* na mão, pois iria estar sozinha boa parte da viagem. E não é que lá tive uma reação alérgica bizarra e precisei ir para o “hospital” tomar adrenalina?

Imaginem a minha situação: presa numa ilha da Tailândia, sem hospital, a horas de distância do continente, mais horas de distância da capital Bangkok (onde haveria mais chances de médicos falantes de inglês). Foi muito tenso, gente! Não desejo que ninguém passe por isso. 🙁

A minha sorte é que essa ilha tinha vários “postinhos de saúde” por conta de uma festa que ocorre todo mês e os turistas perdem a linha bebendo e se drogando, tendo acidentes de moto, cortando o pé nos vidros, etc.
Então, consegui atendimento com uma “enfermeira” que assim que me viu e antes de eu falar nada, já foi me perguntando se eu tinha alergia a amendoim ou frutos do mar e foi me medicando.

O engraçado é que nem fui ao posto por achar que se tratava de uma alergia, porque eu achava que alergia era só ficar se coçando. Fui porque percebi meu corpo inteiro inchando e me sentia “fraca” também.

(Para explicar melhor: Desde que cheguei a Tailândia, meu primeiro destino na Ásia, mostrava um papelzinho com texto escrito em tailandês que eu era alérgica, pedia pras pessoas não colocarem essas coisas nos pratos e por 2 semanas, fiquei de boa. No fim da terceira é que isso foi acontecer, talvez por algum resquício na panela…não sei e acho que nunca vou saber o que realmente causou a reação. :/)

Depois desse episódio, fiquei bem traumatizada e paranóica com tudo o que como até aqui em Portugal. No início do ano, consegui a consulta com a alergo pelo SNS que me acompanhou durante todo o ano de 2016 e chegou a um diagnóstico “parecido” com o do reumatologista: não é uma alergia alimentar ou a algo específico. Adquiri uma urticária crônica pelo meu corpo estar mais sensível a estímulos mais agressivos e isso, mais uma vez, pode ter sido causado pela mudança de país.

Quanto a alergias respiratórias (as quais também nunca tive no Brasil), percebi pequenas reações na primavera por causa do pólen e no inverno por causa do mofo. Já o meu irmão, que sofria de alergias respiratórias graves no Brasil, ao se mudar para cá ainda pequeno, teve uma boa melhora. Portanto, se você vem com crianças é bom ficar de olho nisso para ver o que acontece.

 

» Mofo e Umidade

Aqui acontece uma coisa muito estranha que não sei explicar direito. Ao mesmo tempo que as longas chuvas do inverno fazem com que o clima seja bem úmido, o ar consegue ser seco, deixando o nariz pingando num dia e no outro como se tivesse uma faca lá dentro da garganta rasgando. #tenso #drama

Essa umidade excessiva faz com que tudo pareça e permaneça molhado durante vários dias, criando mofo.

Você abre o armário para pegar um casaco e ao tocá-lo, você o sente úmido mesmo.
Pontinhos de bolor começam a surgir nas paredes, azulejos, portas e objetos de madeira. Nas roupas escuras também.
As roupas lavadas podem levar até 1 semana para secar completamente.
Os artigos de couro natural e até os sintéticos tem que ser armazenados muito bem se não estragam completamente. Perdi várias bolsas desde que cheguei.

É foda.

Eu adoro o frio, amo neve e até gostaria que nevasse aqui. O ambiente invernal me encanta – do lado de fora.

Se você não for morar em uma casa com aquecimento central, e se seu apartamento for grande vai sofrer ainda mais. Porque esse ambiente “molhado” faz o frio parecer ainda mais frio.

Acho o fim da picada ficar tremendo o tempo todo dentro de casa (eu já li que essa tremedeira toda ajuda a emagrecer, pelo menos! haha), ter que usar mil camadas de roupas (odeio ficar com os movimentos limitados), ficar com os dedos dos pés roxos e sentir frio até embaixo da água quente. Sim, até com o banheiro fechado, parece que fica uma corrente de vento gelado passando, como isso é possível?

O meu sonho de consumo é morar num apartamento com aquecedor central. Aquecedores portáteis ajudam um pouco, mas não dá pra deixar ligado o tempo todo porque aqui ninguém é sócio da EDP (a empresa de energia), né?

Lareiras e chão de madeira são detalhes que ajudam também, então, tentem procurar apartamentos e casas assim, com pisos de azulejos somente na cozinha e nos banheiros.



AS ROUPAS

Quando preparava a mudança, me desfiz de trocentas roupas. Ainda assim, vim com 4 malas e 1 mochila cheias. Me arrependi? Sim, um pouco. O conselho que eu sempre ouvia era trazer o mínimo que pudesse porque 1- tem muita roupa barata aqui e 2- o seu guarda-roupa vai mudar completamente. E foi batata!

Assim que cheguei, minha mãe disse que eu pouco usaria minhas roupas de verão e que, com o tempo, essas peças seriam a minoria no meu armário. Cheguei no mês de abril e ainda passei o mês de maio com bastante frio. Esperei o verão chegar de vez em julho para usar as minhas roupas e em meados de setembro já tinha que usar casacos de novo.

E quem mora no Rio, praticamente não tem casaco. É uma jaquetinha jeans aqui, um tricô ali, um casaquinho de nylon fino acolá e não passa muito disso. Aqui, eu percebi que há a necessidade de toda uma gama de casacos: com capuz ou sem, mais curto, mais comprido (pegando até embaixo da bunda), para o vento, para a chuva, para a noite, para a primavera, para o inverno pesado…

E a minha dica é: compre tudo aqui. É sério! Principalmente, os casacos grossos de inverno porque os que vendem no Brasil não são preparados para as baixas temperaturas.

 

Conclusão

Eu sempre tive a saúde impecável desde pequena. Nem catapora, sarampo, essas doenças de criança eu tive. Porém, quando cheguei em Portugal, tudo mudou.

Os médicos disseram que, às vezes, uma pessoa pode ter uma predisposição ao lúpus ou alguma outra doença auto-imune que fica escondida a vida toda, mas quando ela se muda para um ambiente diferente, a doença pode se manifestar. Como eu disse no início do post, no meu caso foi concluído que não era isso e somente uma reação exagerada do meu corpo. Mesmo assim, eles querem me acompanhar e tenho consulta marcada para o ano que vem para ver como anda isso.

Então, resumindo, os sintomas da adaptação que apresentei foram:

  • pele oleosa se tornando extremamente seca e sensível
  • descamação da pele do rosto, orelhas e couro cabeludo
  • rosácea
  • queda de cabelo
  • alergias (diagnosticada com UCE: urticária crônica espontânea)
  • extremidades muito frias, dedos dos pés roxos

A minha intenção com esse post é confirmar que uma mudança de país pode acarretar mudanças não só na nossa saúde mental, mas na física também. E acalmar quem esteja passando por todos esses problemas desde que chegou aqui ou alertar aos que ainda vem que isso pode acontecer. Vale sempre investigar com um médico, mas, provavelmente, na maioria dos casos será uma coisa passageira.

Espero ter ajudado e boa sorte e saúde a todos!
Se você passou por algo parecido ou achou que o post te ajudou, me conta nos comentários?

 

5 comentários em “Morar em Portugal: Como é a adaptação?”

    1. Muito obrigada!!! Nunca tive alergia a nada e passei a ter inúmeros problemas aqui em Portugal, ao ponto de estarem avaliando a necessidade de uma cirurgia.
      Estava achando que esse problema era só comigo 🤣
      Beijosss, tudo de melhor!!!

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